Aumento da violência contra as meninas continua a preocupar instituições sociais

Todos os dias, os relatos de casos de abuso de menores chegam aos ouvidos da sociedade. Alguns são ignorados, enquanto outros, devido às denúncias, são encaminhados pelo Instituto Nacional da Criança (INAC) às autoridades, de forma que os infractores sejam penalizados. Porém, muitos mais são os casos não descobertos, por proteccionismo.

De acordo com dados do INAC, de Janeiro a Setembro deste ano, uma média de mais de 800 casos de crianças, meninas e adolescentes vítimas de abuso sexual em todo o país foram denunciados. A luta contra este mal, para a instituição, é uma tarefa de todos, especialmente em dias como o 11 de Outubro, Dia Internacional da Menina, assinalado quinta-feira.
A data serve, ainda, para reforçar a importância de um maior investimento na liderança e no potencial das meninas e mulheres. Neste dia, a sociedade, os Governos e fazedores de opinião são sensibilizados para as questões de igualdade e violência de género, bem como a reflectir em torno dos preconceitos e estereótipos que colocam entraves na vida escolar e pessoal das raparigas.
O director do INAC, Paulo Kalesi, disse que hoje em dia um dos maiores problemas tem sido o aumento dos casos de abuso sexual em meninas e adolescentes. “São muitas as meninas a serem vítimas de abuso sexual, violência e maus tratos, sobretudo no meio familiar, nos últimos anos”, lamentou.
O INAC, disse, continua a recepcionar as denúncias e a encaminhar às instituições competentes, para dar respostas e proteger essencialmente as crianças e raparigas. O número de queixas, disse, continuam altos. Porém há um esforço muito grande da instituição, para a redução dos casos de violência contra a criança vítima de maus tratos e violência sexual.
Em média, referiu, a instituição recebe denúncia de quatro casos por dia de violência contra as raparigas e crianças. “Apesar de ser um número alto, não reflecte a verdadeira realidade do país, pois ainda existem muitos casos no anonimato, pelo facto de nem todos terem acesso aos serviços da linha de apoio SOS – Criança”, lembrou.
De Janeiro a Setembro deste ano, indicou, o INAC atendeu, em média, mais de 800 casos de meninas adolescentes e crianças que foram vitimas de abuso sexual em todo o país. “Temos garantido assistência às vítimas, que na maioria dos casos não podem voltar para o meio da família”, avançou, além de explicar que o apoio psicológico é garantido aos menores abusados.
Futuro traumático
Anaela Rocha (nome fictício) é uma das inúmeras adolescentes angolanas que já foram vítimas de abusos sexuais. Ainda a fazer exames de saúde para ver como está, a menina moradora do Cazenga, em Luanda, foi abusada sexualmente e maltratada pelo tio.
Com rosto cabisbaixo ao falar, devido ao repúdio de lembrar tal acto, Anaela contou que tudo começou quando saiu da província de Malanje, onde vivia com os pais e irmãos, para vir à Luanda morar na casa do tio. “Me mandaram para vir estudar. Os primeiros meses de convivência na casa do tio foram tranquilos e sem nenhuma desconfiança”, recordou.
Mas, disse, com o passar dos anos, o tio passou a ter um comportamento estranho, aproveitando-se da ausência da esposa, que saía todos os dias muito cedo para ir vender, para passar a assediar a adolescente, chegando ao ponto de a ameaçar de morte.
“Inicialmente, ele me aliciava com valores e roupas. Pelas várias recusas, começou a me ameaçar de morte. Nos últimos dias já não me deixava ir à escola, nem mesmo sair para brincar com as minhas amigas. Nesta altura, ele começou a abusar de mim”, explicou, além de referir que, com um pouco de coragem, contou à mãe de uma amiga e a ajudou a denunciar o tio.
Hoje, com tristeza, disse que já não é uma menina igual as outras, pois apesar de ter saído do alcance do tio e estar mais protegida sobre os cuidados da avó, tem muitas dificuldades para associar-se a outras adolescentes.
“Desde o abuso já não me sinto a mesma. Antes era alegre e cheia de energia, gostava de brincar com as amigas. Agora, sinto como se fosse adulta. Até mesmo em casa, me fecho no quarto e tenho medo de quase todos, principalmente de homens, quando se aproximam de mim, penso logo que serei abusada outra vez”, contou.
Família e Promoção da Mulher pede maior atenção aos direitos da Rapariga
A Secretaria de Estado para a Família e Promoção da Mulher contou que os desafios enfrentados por muitas meninas e adolescentes a nível do mundo estão ligados à questão dos direitos da Rapariga e a salvaguarda, no que concerne à violência sexual, o acesso à educação e à saúde.
Alcina Kindanda informou que para contrapor tais dificuldades, o Executivo angolano tem estado a apostar no empoderamento da rapariga, por meio de diversos projectos, um deles denominado “Aprendizagem para todos “, onde são abordados temas ligados à saúde sexual reprodutiva, assim como o planeamento familiar, a gravidez precoce e os casamentos prematuros.
No mesmo projecto, referiu, as raparigas também têm acesso ao ensino obrigatório. Todos os anos, acrescentou, as meninas enfrentam desafios para uma formação académica e uma vida livre de violência.
“Geralmente, a questão da sensibilização das meninas tem sido focada na formação, com incidência na educação em tecnologias, de forma a acabar com as desigualdades sociais”, destacou, adiantando que o investimento na implementação dos direitos da menina continua a ser insuficiente.
A data
Em todo o mundo, disse, milhões de meninas sofrem todos os tipos de discriminação, abusos e violência desde a primeira infância. A desigualdade de género, por exemplo, é uma prática que contribui para o aumento da pobreza contra meninas. Diante dessa realidade, surgiu o “Dia Internacional da Menina”.
Para alterar essa realidade, a organização internacional sem fins lucrativos Plan International lançou a campanha “Por Ser Menina”, uma acção global que visa evidenciar as situações de violência e preconceito vividas por meninas ao redor do mundo.
A iniciativa tem o objectivo final de consciencializar a população mundial sobre o empoderamento das meninas de todo o mundo e, particularmente, em países em desenvolvimento, por meio da educação. Além disso, a iniciativa serve para incentivar o desenvolvimento de projectos e políticas públicas para impulsionar o potencial das meninas e assegurar o pleno exercício de seus direitos. Uma pesquisa feita com mais de 1.700 meninas, de 6 a 14 anos, nas cinco regiões revela um panorama muito preocupante, assente num contexto gritante de desigualdades de género.
Fonte: JA

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